Pode admitir: provavelmente você assistiu a um vídeo feliz nos últimos dias.

São aqueles vídeos que arrancam um sorriso, ou até mesmo uma lágrima de emoção positiva. Como a experiência de famílias que escapam da vida caótica na cidade para viver na tranquilidade do interior. Histórias de pessoas que ajudam um desconhecido e acabam transformando suas vidas. Ou um bebê de apenas três meses “conversando” com a mãe.

Esse sentimento positivo está totalmente incorporado na cultura popular e, atualmente, ganha espaço com inúmeros perfis fazendo sucesso nas redes sociais ao compartilhar conteúdo que provoca uma sensação acolhedora e reconfortante nas pessoas.

Então, por que a positividade está em alta agora?

Por que os usuários buscam conteúdo positivo

Com tanta coisa acontecendo nos cenários político, econômico e ambiental ao redor do mundo, apreciar as pequenas coisas muitas vezes faz toda a diferença. Um estudo global realizado pela Kantar apontou que sete em cada dez pessoas dizem que tentam ser otimistas, apesar da atual incerteza econômica.

Por isso, histórias que nos mostram o lado humano dos criadores de conteúdo, e despertam empatia e compaixão por eles, têm sido cada vez mais frequentes. No Brasil, Vandressa Ribeiro dividiu etapas emocionantes de sua gestação com os mais de dois milhões de inscritos em seu canal, incluindo a reação da família e de amigos ao receberem a notícia da gravidez.

“As pessoas buscam conteúdos assim como uma forma de autocuidado, para ajudar a regular as emoções”, diz Earnest Pettie, especialista em cultura e tendências do YouTube.

Nancy Puccinelli é professora de marketing na Universidade de Bath e também colabora com a Universidade de Oxford, ambas no Reino Unido. Ela explica que esta regulação emocional é uma válvula de escape para muita gente.

“Me obrigo a ficar atualizada sobre as principais notícias, por mais duras que sejam, porque preciso estar informada. Mas, na hora de relaxar à noite, sou atraída por um feed do Google em que aprendo como reaproveitar grãos de café para adubar o jardim ou descubro um novo restaurante abrindo na vizinhança. Ainda que não pareça ‘importante’, percebi que prefiro este conteúdo leve, que me faz sentir bem”.

Amitav Chakravarti, professor de marketing na London School of Economics, explica: “As pessoas se sentem mais calmas, relaxadas, além de generosas e altruístas, quando se conectam a conteúdos positivos”.

Ao assistir a conteúdo desse tipo, o corpo libera dopamina, a substância química responsável pela motivação, satisfação e prazer. O ser humano está programado para buscar experiências positivas, pois a dopamina ajuda a controlar a memória, o sono e a concentração.

Chakravarti, que é especialista em psicologia do consumidor, diz que a vontade das pessoas por conteúdo positivo pode ser atribuída ao desejo humano de identificar-se com os demais, algo que o conteúdo positivo proporciona por meio da conexão entre pessoas.

Por que as marcas aproveitam o conteúdo positivo

As marcas estão aproveitando este fator de bem-estar para despertar a generosidade dos consumidores, incorporando a positividade nas campanhas de marketing mais recentes.

A campanha Worldwide Hide, da marca de chocolates britânica Cadbury, foi criada em torno do altruísmo, convidando as pessoas a esconder um ovo de Páscoa digital no Google Maps para alguém especial.

Já a marca de comida para gatos Sheba lançou uma campanha publicitária visando salvar recifes de coral. Com imagens emocionantes da vida marinha, o vídeo aproveitou a monetização do YouTube para aumentar as visualizações e direcionar o valor para a causa.

Puccinelli realiza muitas pesquisas sobre o ânimo e as emoções dos consumidores, e conta que, na televisão, 90 a 95% dos anúncios publicitários são positivos e otimistas.

“A premissa básica é que, se o anúncio fizer as pessoas se sentirem bem, a atitude em relação a quase tudo que você lhes mostrar será consideravelmente mais positiva . Há também um impacto significativo no comportamento – em igualdade de condições, se uma marca me faz sentir bem, estarei inclinado a escolhê-la”.

As marcas também se beneficiam desse tipo de conteúdo para atingir a próxima geração de consumidores. Conteúdo positivo é popular entre a Geração Z. Uma pesquisa da Ipsos de 2022 descobriu que a Gen Z adora assistir conteúdos como ASMR, transmissões ao vivo de animais ou vídeos nostálgicos para ajudá-los a relaxar.

Dicas para profissionais de marketing usarem conteúdo positivo em campanhas

Assim como os criadores populares, os profissionais de marketing podem aproveitar certos elementos que trazem positividade ao conteúdo, mas não devem complicar demais as narrativas. Chakravarti explica: “O que fica na memória das pessoas são as coisas simples, inesperadas e emocionantes”.

Puccinelli afirma que, em alguns dos anúncios mais marcantes, ninguém consegue lembrar qual era o produto: “Uma boa publicidade não necessariamente vende produtos”.

Pettie diz que histórias pessoais, ou que mostram alguém ajudando uma pessoa ou um animal, por exemplo, também envolvem o público. “A narrativa que toca o coração do espectador muitas vezes terá um elemento altruísta”, explica.

O canal do criador John Leitão, por exemplo, é popular por misturar humor e emoção. Nos vídeos, ele aborda pessoas desconhecidas na rua para surpreendê-las com atitudes positivas – seja fazendo um elogio ou comprando toda a mercadoria de uma vendedora de pulseiras.

No que considera uma das experiências mais marcantes que já teve durante as gravações, Leitão conheceu a história de uma mãe solo e a ajudou a terminar a construção da casa própria.

Outro elemento a considerar é a estética do conteúdo. Pettie conta que conteúdo positivo nem sempre precisa ter uma narrativa clara. “Buscamos conteúdo relaxante, vídeos de pessoas limpando objetos ou de uma vida mais simples conectada à natureza. É um escapismo estranhamente satisfatório”.

O conteúdo ajuda as pessoas a entender a incerteza ao redor, permitindo uma fuga ou uma distração do estresse em suas vidas ou no mundo em geral. O canal Oddly Satsifying no YouTube, por exemplo, tem mais de dois milhões de assinantes.

Mas qual o fator mais importante na criação de um marketing positivo eficaz? A autenticidade, de acordo com Chakravarti. “A linha entre autenticidade e uma ideia complicada pode ser muito tênue. Um exemplo é quando uma marca criou um anúncio em que uma celebridade famosa usava seu produto como forma de aliviar tensões durante manifestações. A ideia era tentar criar um diálogo, mas acabou sendo estranho e falso – o oposto da autenticidade”.

Para Puccinelli, a autenticidade é o Santo Graal dos profissionais de marketing. Ela explica: “Os clientes ficaram tão céticos que é cada vez mais difícil ser visto como autêntico – seja pela percepção de falta de consciência ambiental ou pela tentativa de sensibilizar de uma forma falsa ou visando lucro.

“Por exemplo, no passado, criadores perderam uma base de fãs leais porque perceberam que eles só queriam lucrar”.

As marcas que buscam incorporar conteúdo positivo em seu marketing podem ajudar os consumidores a se sentirem bem consigo mesmos, com a marca e com o mundo em geral. E, como consequência, os profissionais de marketing também se sentem bem.

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